sábado, 20 de setembro de 2014

Amor(tecer)

Quando os dias são maiores do que parecem e o silencio é o único barulho anunciando uma nova noite. Aumentamos nossas chances de sermos normais, ou não? Somos feitos de poeira, deixando rastros de sujeira por ai, rastros de coisas soltas, rastros de sonhos soltos. Deixei para trás uma montanha com desabamento marcado, acho que explodiu, deixei pra trás ilusões soltas, empoeiradas, enlameadas, despedaçadas e desacreditadas, sai limpa dali de um casulo pequeno demais e velho demais pra me suportar, saí dali sangrando, respingando nas paredes, sujando a realidade, sai dali insana, gritando e soltando qualquer demônio escondido, sai dali humana, chorando e perguntando ao acaso o porquê de tantas dores. Foi como um ritual de passagem, insinuando que a dor é necessária e que precisa ser sentida. Hoje me sinto inteira, analiso as minhas cicatrizes como quem admira um quadro do Picasso, uma primeira edição do Poe, um disco do Beatles, mesmo que em volta esteja tudo em ruínas, sobrando apenas pedaços pra ajudar a reerguer, comecei a por os pequenos tijolos, a montar um novo quebra cabeça de mil peças. Sabe é meio solitário aqui, tudo em volta tem letras e eu só escuto músicas, leio livros, realizo provas, faço amor. Só acredito em poucas vozes, só me entrego a uma, só me sensibilizo com patas e bigodes e é nesse mundo que encontrei a calma, claro que a euforia me alcança as vezes, respiro fundo observo o sono, choro um pouco e continuo, viver é uma coisa dolorida sabe, mas é preciso ser sabe, é preciso ser feliz mesmo que as vezes tudo pareça um extremo, eu volto a continuar, sempre volto, viver é sim uma coisa estranha, as vezes dá uma desesperança de tudo, as vezes tudo arde, tudo fere, tudo coça, mas é preciso esquecer a vertigem de viver, o mundo não acaba agora, o mundo não acaba aqui e o meu mundo foi feito de massa de modelar para ser mais fácil modificar. A lagarta que fui deixou o casulo fraco e nasceu borboleta pulsante para parar de temer, não sinto medo, não sinto fome, não sinto tristeza e aonde estou sinto um amor único, incapaz de se dividir e se expandir, aonde estou é longe demais de onde eu deveria estar e quem eu fui desapareceu pra longe, tão longe que deixou de existir.

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